
Com o objetivo de promover e estimular uma reflexão crítica sobre a
permanência de figuras, valores e perspetivas da Antiguidade Clássica na
Literatura e na Cultura Ocidentais, o Centro de Estudos Filosóficos e
Humanísticos da Faculdade de Filosofia da Universidade Católica
Portuguesa, em Braga, através da sua Linha de Investigação Estudos
Literários e Culturais, Projecto 3 - "Matrizes Clássicas - da
Antiguidade à Modernidade", está a organizar um Colóquio Internacional,
subordinado ao tema «Narrativas do Poder Feminino».
O
Colóquio, a realizar-se nos dias 26 e 27 de abril de 2012, nas
instalações da Faculdade de Filosofia de Braga, pretende abordar, a
partir da conjugação de vários campos de investigação (Estudos
Clássicos, Estudos Literários, Psicologia e Sociologia e Estudos
Artísticos, Culturais e Históricos), unidos pela necessidade de manter
vivo o legado de uma etapa da história da humanidade centrada na figura
humana em todas as suas dimensões, a temática da relação da mulher com o
poder, do modo como foi interpretada e narrada na Antiguidade e das
suas reinterpretações posteriores.
Desde a Antiguidade
que a relação entre a mulher e o poder foi pautada por bastante
ambiguidade. Cedo existiu uma associação correlativa do poder à força
física, apanágio do género masculino. A fragilidade feminina, aumentada
pela sua alegada instabilidade emocional, tornava-a inadequada para o
exercício de qualquer poder aos olhos de sociedades eminentemente
guerreiras. Ainda assim, uma mulher como Helena foi poderosa a ponto de
causar a guerra mítica que marcou toda a tradição clássica e escapar
incólume; e nessa epopeia várias mulheres mostraram o quanto podiam
influenciar o homem, havendo até aves rarae, como as Amazonas, que
usurpavam os domínios masculinos da guerra e do trono.
A
Grécia Clássica olhará com estranheza e receio criaturas como as
Bacantes, que o álcool transformava em animais selvagens, e as Bárbaras,
detentoras de artes mágicas e paixões incontroláveis. Mulheres como a
mítica Medeia e a inquietante rainha Olímpia eram a prova do que sucedia
quando se dava rédea solta a um ser escravo das paixões. Apesar de
existirem grandes mulheres como Aspásia por detrás de grandes homens
como Péricles, a reação foi remeter a mulher livre para o recato do lar,
impedindo o seu acesso à vida política e controlando os seus bens e
vida privada através de tutores. Tal exemplo, em parte seguido numa Roma
assustada pelas orientais Cleópatra e Zenóbia, será projetado para a
posteridade e associado ao modelo semítico na herança judaico-cristã.
Passados
longos séculos em que o desenvolvimento das ideias, da ciência e da
sociedade ocidental levou ao debate em torno das capacidades e direitos
femininos, as marcas do passado cristalizado no legado clássico
continuam visíveis.
Não só as personagens da
Antiguidade persistem no nosso imaginário, inspirando novas
interpretações artísticas e científicas, como a ideia da supremacia
masculina domina todos os níveis da realidade, refletindo-se na própria
linguagem e sendo assumida pelas mulheres, mais ou menos
conscientemente. É assim que sempre que uma mulher assume o poder se vê
confrontada com os estereótipos eminentemente masculinos.
Mas
o poder feminino exerce-se também noutros âmbitos, da família ao espaço
laboral e público em que ela cada vez mais imerge, quer por
necessidades financeiras, quer para se realizar como ser humano. Novos
desafios, de algum modo já visíveis no passado, resultam da "vida dupla"
que a sociedade contemporânea exige à mulher, sem lhe dar quase nada em
troca: mãe e companheira do homem num mundo muito complexo e veloz, ela
é também obrigada a assumir, na sua vida profissional, uma competência e
intensidade padronizadas de acordo com o masculino. Para vencer, deve
ser como um homem, mas será condenada socialmente se perder a dimensão
feminina.
Existe uma forma feminina de exercer o Poder?
É essencial ser poderosa de algum modo para ser bem sucedida? Em que
medida continuam presentes as marcas da Antiguidade Clássica?
O
Colóquio Internacional "Narrativas do Poder Feminino" pretende debater
estas e outras questões de modo a partilhar, de forma interdisciplinar,
as experiências e estudos que várias áreas do saber têm desenvolvido
sobre este tema de tão grande actualidade.